Síndrome que atinge um em cada 70 meninos afeta todos os que convivem com os pacientes. Familiares lutam por respeito e pelo fim do preconceito
“Quando se trata de autismo, parece que estamos começando a Medicina”, diz o médico geneticista Salmo Raskin, presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica. Segundo ele, não há pais que não fiquem apavorados quando o filho recebe o diagnóstico de autismo, que não tem cura. “Existe o estereótipo e até o preconceito”, diz. Para resolver isso, comemora-se hoje o Dia Mundial da Conscientização sobre o Autismo.
“Quem já ouviu falar em autismo imagina aquela criança sentada de frente para a parede balançando a cabeça, em outro mundo, e isso é assustador”, diz Raskin.
Hoje fala-se em transtorno do espectro autista, que tem um “leque” de possibilidades: a criança pode ter um alto comprometimento mental e outras síndromes associadas – e aí até caberia a cena descrita acima –, como pode ter pequenas dificuldades nas interações sociais e na comunicação, mas ter inteligência acima da média.
Se receber o diagnóstico de autismo pode ser desesperador, é fora do consultório que a batalha diária começa a ser travada – contra a doença e contra a falta de informação. “Na prática clínica observa-se que existe um incômodo ou angústia comum às famílias de pessoas com transtorno do espectro autista. Nem sempre o sofrimento é verbalizado ou claro, podendo causar até sintomas físicos nas pessoas que o vivenciam”, explica Julianna Di Matteo, psicóloga da Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência (Avape) e especialista em Terapia Cognitiva Comportamental pela USP.
Luciane Maria Janiski Loureiro, 32 anos, mãe dos gêmeos Rafael e Gabriel, 4 anos, começa a sentir as consequências das noites sem dormir, da má-alimentação, do estresse e da ansiedade. Além de Gabriel ter nascido prematuro, com baixo peso, e ter sido submetido a diversas cirurgias ainda bebê, há menos de dois anos ele recebeu o diagnóstico do autismo. “De repente, ele se isolou. Enquanto o irmãozinho começou a falar e a brincar com as outras crianças, o Gabriel ignorava todo contato e ficava deitado no degrau da escada por horas. A fala não evoluiu e os gritos eram constantes, assim como os problemas para dormir. Nunca sabíamos o que ele desejava e chorávamos junto por não sabermos nos comunicar”, conta. Luciane e o marido, Eliseu, um corretor de imóveis de 36 anos, buscaram ajuda médica e hoje Gabriel frequenta uma clínica especializada. Mas, apesar de ver o filho se desenvolvendo melhor, agora Luciane é quem precisa de ajuda. “Sempre enfrentei todos os desafios, com paciência e força, mas tenho crises de dor no peito, estresse, cansaço e problemas gástricos”, diz.
A causa do estresse familiar não está apenas nos maiores cuidados que uma criança com o transtorno exige (veja quadro ao lado). Socialmente, conviver com o autismo ainda é um desafio. “Ir ao supermercado ou shopping era complicado, pois o Gabriel gritava e ouvíamos: ‘Nossa!’, ‘Que horror!’, ‘Que criança estranha!’, ‘Que falta de educação!’”, conta.
Apoio
Famílias com caso de autismo deveriam receber apoio psicológico, pois apenas com familiares esclarecidos e unidos uma criança com autismo tem chances de se desenvolver, segundo a psicóloga Leda Fischer Bernardino, pós-doutora em Tratamento e Prevenção Psicológica pela Universidade de Paris e professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. “Os pais deveriam poder contar com atendimento individual e em grupos de apoio, pois é importante que eles possam entender o que acontece com o filho, como podem se relacionar com ele e, nos casos de intervenção precoce, como não desistir do contato significativo com o bebê. Se o casal não é ensinado a lidar com a situação de ter um filho com dificuldades especiais, até a vida conjugal fica seriamente perturbada”, explica Leda.
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