A história de Ana Paula, ditada pelo piscar de seus olhos, mobiliza legião na internet
Em Três de Maio, no noroeste gaúcho, uma jovem se comunica com o
mundo pelos olhos. No último dia 16, paralisada em uma cama no seu
quarto, ela dedicou três horas a ditar uma carta, sinalizando com um
cerrar de pálpebras a cada vez que lhe exibiam a letra certa. Depois de
998 caracteres, concluiu a mensagem, iniciada com uma apresentação:
"Meu nome é Ana Paula Soares de Almeida. Tenho 21 anos. Escrevo
esta carta para contar um pouco da minha história. Hoje faz 8 meses e
meio que estou sem conseguir falar e movimentar pernas e braços, sendo
totalmente dependente para me comunicar, mexer, deslocar, alimentar,
vestir, calçar, higienizar. Compreendo, sinto e lembro tudo. Minha vida
se resume a um quarto, da cama para a cadeira de rodas e vice-versa.
Passo meu tempo assistindo à televisão, lendo, recebendo visitas e
fazendo os tratamentos e os exercícios que minhas terapeutas indicam.
Meu provável diagnóstico é romboencefalite criptogênica".
Ana Paula fala com os pais e escreve pedidos de ajuda por meio do alfabeto Esarin, um quadro no qual as letras são organizadas na ordem de uso mais frequente. É um método trabalhoso. Ana Paula olha para a letra, alguém aponta e ela confirma com uma piscadela. Dessa forma, vem escrevendo a própria história em um blog, batizado de A Vida em uma Cadeira. Os textos são postados na rede com ajuda da fonoaudióloga e de uma amiga.
O que Ana Paula busca é ajuda para sair de sua atual condição, à qual
se viu presa de forma repentina e sem aviso. No dia 31 de agosto do ano
passado, a jovem sentiu uma forte dor de cabeça. Depois de três idas ao
plantão médico, sofreu uma convulsão, à qual seguiram-se 49 dias de
internação no Hospital São Vicente de Paulo. Sobreviveu, mas perdeu
quase todos os movimentos. Tem algum controle da cabeça, dos ombros e de
alguns dedos das mãos.
Na carta do dia 16, ela explica que sua doença é rara e que ela
anseia por uma consulta com algum neurologista que possa ajudá-la:
"Gostaria de ter um diagnóstico mais preciso. Existe algum
tratamento diferente para eu me recuperar? Onde? Quando? Como? É bem
difícil estar passando por isso. (...) Escrevo para divulgar a história
no intuito de buscar ajuda, seja em relação a novidades no tratamento ou
a qualquer outro aspecto que possa facilitar a nossa rotina."
Os apelos laboriosamente escritos repercutiram na internet e
comoveram a comunidade de Três de Maio, motivando a criação da Missão
Ana Paula, um grupo criado no Facebook há pouco mais de duas semanas. Já
são mil membros. Algumas postagem chegam a ter 500 comentários e 12 mil
"curtidas". Com autorização dos pais da jovem, o grupo abriu uma conta
bancária para arrecadar doações.
— Estamos fazendo contatos com quem possa ajudar e divulgando a
história para o máximo possível de pessoas — conta um dos responsáveis
pela iniciativa, Mateus Guizzo, do Leo Clube de Soledade.
Os pais de Ana Paula vivem da venda de doces, feitos em casa, e não
têm condições de pagar um especialista para avaliar a filha. Por
enquanto, ela é acompanhada por profissionais da fonoaudiologia,
fisioterapia e psicologia.
— Queremos agendar uma consulta particular com especialista em
neurologia de Porto Alegre, porque o SUS demora — diz a mãe, Marli
Herpich.
Usando o alfabeto Esarin, Ana Paula resumiu sua luta a Zero Hora:
— Quero encontrar um médico que conheça a doença e me ajude. Por
isso, também vou continuar escrevendo meu blog, para contar a minha
história e tentar ajudar pessoas que possam estar passando por problemas
como eu.
A DOENÇA
Saiba mais sobre a romboencefalite criptogênica
— É uma inflamação, de difícil diagnóstico, que atinge o tronco
cerebral e pode ter diversas causas, como um vírus, uma bactéria ou até
uma doença autoimune e de difícil confirmação em adultos
— Um possível tratamento consiste em administrar altas doses de
imunoglobulina, que são grupos de anticorpos, que poderiam modular o
sistema imunológico do paciente. Também é realizado com corticoides com
aplicação intravenosa
— Considerada grave, a doença pode deixar sequelas, como no caso da jovem de Três de Maio
— Para tratar as sequelas deixadas pela doença, o Hospital Sarah
Kubitschek, em Brasília, especializado em reabilitação, é um dos locais
indicados pelos médicos
Fonte:Valdemar Borges, neurologista de Três de Maio, que
diagnosticou e acompanhou o quadro da jovem e Marcus Tulios Teixeira da
Silva, membro do Departamento de Moléstias Infecciosas da Academia
Brasileira de Neurologia, que também atua na Fundação Osvaldo Cruz e já
tratou com sucesso um caso semelhante.
FONTE AQUI
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