sexta-feira, 16 de junho de 2023

18 de Junho - Dia do Orgulho Autista

 

Essa data pode lhe soar estranho. Confesso que a primeira vez em que fiz parte entre famílias deste movimento, me questionei: “Orgulho?” Eu estava entre famílias de longo caminho percorrido, enquanto carregava meu menino nos braços e a expressão de todos era de verdadeiro orgulho. Hoje, são 17 anos que estou neste caminho e parei para admirar. Eu sinto orgulho da nossa caminhada. 

Qualquer pessoa que saia dos padrões de “normalidade” aceitos pela sociedade, já viveu alguma situação de preconceito ou rejeição. Diante do autismo e todas as adaptações que esta realidade exige, nós vivemos isso todos os dias (ou proveito da deficiência dos nossos filhos, pois viramos vantagem para algumas pessoas em nossa vulnerabilidade). Nos deparamos com o lado sombrio das pessoas, que em grande parte das vezes, não disfarçam seu preconceito e desfavores à humanidade. Vivemos isso todos os dias. Assim como as adaptações, a indiferença e o egoísmo também são parte

da nossa rotina. 

Então, orgulho de quê? Orgulho da nossa força, coragem e determinação em fazer o melhor em toda nossa trajetória de vida. Entre erros e acertos em um caminho que desafia a própria medicina. Orgulho de encontrarmos também as melhores pessoas que fazem parte deste mundo e é porque elas existem, que colecionamos histórias incríveis de superação(podemos continuar acreditando na humanidade apesar de tudo) e ousamos com todo o amor, transformar o mundo em um lugar melhor para aqueles que estão chegando, caso não seja possível colhermos do nosso próprio plantio. 

Sim, a gente transforma a sociedade apenas com a coragem que o amor nos abastece e é preciso muita coragem para se posicionar e defender o que acredita, muitas vezes sozinha e diante de uma multidão. Entretanto, é porque existem pessoas que ainda amam o próximo (empatia) e lutam por amor (pessoas sem preço) que estamos evoluindo, embora lentamente para uma humanidade apta à humanidade, sem descartar ninguém. (Você lembra como era na sua infância?) 

Não, não é nada fácil, mas é válido, é admirável, é a nossa história, nossa passagem por este mundo e nos orgulhamos e muito de cada passo, de todo percurso, convictos que existe um Deus que protege todos àqueles que agem por amor e em defesa dos que não se defendem.

A primeira vez que vivenciamos empatia durante uma crise

Confesso que pensei muito antes de escrever, mas existe beleza até mesmo nos piores momentos em que vivemos e gostaria que o ocorrido inspirasse outras pessoas a serem empáticas. 

Nós familiares de pessoas com autismo sabemos que vivemos em uma montanha-russa. É fato. Não temos como sair dela. Com subida suave e descida impactante. 

Ângelo ama ver vídeo de toboágua e o levei no Acqualokos para vivenciar o que assiste. Ele estava muito feliz, escorregou incontáveis vezes até encontrar a piscina com ondas e realizar seus mergulhos... Porém, a piscina com ondas apresenta um show com os personagens do clube e ergueram muito o volume para animar as pessoas. Cheguei a pensar que ele ia conseguir porque estava muito feliz, mas ele se desorganizou. Há tempos não vivia uma crise de autismo, mas ela veio e bem forte.

 Corri com o Ângelo para o banheiro feminino, pensei em limitar o espaço que pudesse correr, já que não conheço o parque e não saberia outro local e sem falar que era uma emergência. No banheiro ele se encolheu, mas estava desorganizado: entra e sai, barulhos, conversas... E mesmo sem ninguém fazer qualquer "cara feira" por um moço estar ali, o Ângelo começou a se agredir. Meu filho não tem agressão com outras pessoas, apenas com ele mesmo, mas se no desespero for contido, ele pode agredir. No meu instinto de mãe, vendo meu filho se machucar, fui contê-lo. Eu sabia que ele me machucaria, mas desviaria o ato de se agredir. 

Nesse momento, entra uma mulher que sentia um desconforto por causa dos cílios e pelo espelho nos avistou. Ela chegou perto e disse que eu não teria força física para protegê-lo e eu respondi que tudo bem, num tom de "sai daqui". Então, ela disse que era professora e tinha contato com muitas crianças com autismo e que ao tranquilizar meu coração, eu saberia o que fazer para que ele se organizasse. O meu sentimento ali era de ter perdido o controle, mas olhei em volta e percebi que todas estavam disposta a nos ajudar. Veio na minha cabeça uma lembrança enquanto professora,de muitos anos atrás, quando uma aluna minha havia se desorganizado e fui ajudá-la para não se machucar. Nesse momento, sem que eu pedisse, todos estudantes fizeram silêncio, fecharam a porta, janelas, cortinas e continuaram a copiar do quadro como se tudo estivesse bem e em segundos estava mesmo. Pedi para as mulheres bloquearem as entradas e elas bloquearam enquanto alguém avisava o pessoal do clube o motivo, outras também conduziam as meninas pequenas para fora para não se assustarem e todo mundo ficou em silêncio. Então conversei com o Ângelo em tom baixo e calmo explicando que o momento difícil dele acabou e estava tudo bem. Em pouco tempo, tudo ficou bem. Os monitores do AcquaLokos nos acompanharam até se certificarem que tudo estava bem, carregando nossas mochilas. As pessoas em volta alcançavam nossas coisas e um menino pequeno ainda veio avisar que a sunga do Ângelo estava mais baixa. Até as crianças queriam ajudar.<3 b="">

<3 b="">Foi a primeira vez na minha vida que eu vivenciei todo esse amparo e empatia. Eu sou tão acostumada com o egoísmo das outras pessoas e julgamentos que quando eu percebi todas dispostas a me ajudar a proteger o Ângelo frente a condição dele, colocaria o "Hulk" no chinelo de tão forte que me senti. Foi uma das cenas mais linda da minha vida diante dos desafios do autismo. Para o clube e para as pessoas presentes era normal o que aconteceu e todos se envolveram a ajudar. 

Sendo guardiã/protetora de toda caminhada nesse mundo de uma pessoa com limitação e tendo total consciência que tudo pode mudar numa questão de segundos, esses momentos nos afetam demais. Não somos guerreiras. Precisamos ser fortalecidas também. Duvido uma mãe se acostumar sem sentir nenhuma dor. Mas estou com o coração cheio de gratidão. 

Por mais espaços com conhecimento e empatia. Nossos filhos, assim como todos, merecem ter momentos de lazer, sendo respeitados e acolhidos diante de suas limitações. Gratidão 🙏