sábado, 18 de janeiro de 2014

Inclusão: com os olhos dos pais

Depois de tantas mensagens recebidas perguntando como foi incluir o Ângelo numa escola regular e o que senti, decidi escrever mais uma vez sobre essa experiência.
Ao contrário do que a sociedade pensa, incluir o filho com deficiência na escola não é nada fácil. Não é apenas efetuar a matrícula tampouco negar o fato que ele vive limitações.
Não, não! Incluir o filho na escola exige caminhada, pesquisa e muito diálogo! Além disso, estudos e a experiência de outras pessoas comprovam os benefícios da inclusão para todos os envolvidos.
Temos total consciência das limitações dos nossos filhos frente às crianças que conviverá. Não estamos rejeitando isso, pelo contrário, somos os primeiros a nos colocar à disposição no que for preciso, possível e impossível para sanar as dificuldades que aparecerão.
Antes de finalmente assinarmos a matrícula, caminhamos por inúmeras escolas até tomarmos a decisão.
Sei que a internet está aí e nos facilita muito no quesito de solicitar uma vaga na escola, mas não para uma mãe com filho com deficiência, a menos que ela já tenha feito todas as visitas que desejava esse recurso tecnológico fica completamente de lado. Precisamos do "olho no olho" e estamos atentos a toda e qualquer expressão que possa ser feito enquanto falamos sobre nossos filhos.
No meu caso, nem mesmo informação na Central de Matrículas usei o telefone. Precisava ir até lá e ouvir o que já sabiam sobre inclusão. Lembro-me até hoje do rapaz que me atendeu, logo chamou uma professora para me explicar e quem estava esperando, aproximou-se curioso para ouvir um pouco sobre o Ângelo.
Depois iniciaram-se as visitas às escolas...Isso não foi nada fácil porque carregávamos conosco uma história triste de rejeição da Ed. Infantil.
Ângelo não foi aceito em nenhuma escolinha, sempre ouvimos que não haviam vagas e que ficaria na fila de espera... Enquanto isso, as crianças do condomínio eram imediatamente aceitas.
A escolinha que o recebeu começou como um sonho, mas terminou como um pesadelo... Na época usava fraldas e percebi o quanto de gíz de cera ingeria. Era deixado de lado num canto da janela, por vezes chorando muito, enquanto a professora de costas escrevia nas agendas ( eu vi isso). Também cheguei um dia em que estavam fazendo fila para o lanche e o Ângelo foi levar até ela uma "malinha" de brinquedo e devido a sua coordenação motora, não a fechou corretamente e no caminho ela se abriu e os objetos caíram... A professora virou os olhos e disse: "que coisa". Era uma turma de 5 alunos neste momento, mas imediatamente o retirei.
Triste, muito triste... Recém havia comprado toda lista de materiais e iria ficar com ele em casa...
Mas... não podia deixar amarelar aquelas folhas, muita obra criativa poderia ser construída nelas! Fui abençoada por vizinhas que incentivavam o convívio de seus filhos com o meu. Foi como se criássemos nossa própria inclusão e não dependia de nenhuma escola e sim da solidariedade das crianças próximas.


Voltando à escolha da escola, realizei muitas visitas nas redondezas de onde moro e uma delas me disse não conhecer o autismo, mas seja lá o que for que eu levasse até eles, seria bem vindo. "Seja lá o que for" foi determinante para nunca mais chegar próximo daquela escola.
Cresci diante do ambiente escolar, não conseguia imaginar que o lugar do meu filho era do portão para fora! Porém, não poderia permitir que as pessoas lhe tratassem como aconteceu na experiência anterior... Não era isso que ele merecia!
Precisava de uma escola que o recebesse à tarde devido ao distúrbio do sono, pois descansando bem se desenvolveria melhor.
Precisei reformular meus planos quando conheci a escola escolhida, pois ela recebia os pequenos pela manhã. A secretária falou sobre deficiências com muita naturalidade e carinho, dizendo que eu poderia voltar e falar com a professora da sala de recursos. Neste dia, me apresentou a diretora que em nenhum momento fez "caras e bocas" por se tratar de inclusão.
Com certeza voltei lá para ver se a impressão permanecia e PERMANECEU! A secretária chamou a professora da sala de recursos e tive certeza que deveria confiar naquela equipe para fazer parte da nossa caminhada!
Agonia iniciava-se por receber retorno sobre a vaga... Todo mundo já havia sido designado à alguma escola, menos o meu filho!
Foi hora de correr atrás da Secretário da Educação! Tanto o Secretário quanto sua assistente foram muito atenciosos dizendo que o Ângelo estava designado à escola escolhida e por se tratar de um aluno com deficiência tinha prioridade na escolha e sua vaga estava garantida desde o primeiro dia. Aliás, foi solicitada no primeiro dia em que abriram as inscrições, pessoalmente na escola, para nada dar errado.
Ao contrário das outras crianças, nossos filhos iniciam o compromisso escolar um pouco antes. Levamos o Ângelo conhecer o ambiente escolar, professora, monitor antes de iniciarem-se as aulas. Entregamos um relato com todas particularidades dele, com a intenção de abreviar o tempo que levariam para conhecê-lo e respeitar algumas questões sensoriais que eram até mais acentuadas na época. A escola fez algumas adaptações em função do aprendizado diferenciado e ele ama estar lá!
Para não dizer que sempre foram flores, pensei em desistir da inclusão quando ocorreu troca de monitor. Ângelo se desestabilizou. Foram 3 semanas, se não sozinho, sempre com pessoas diferentes. Ele perdia a vontade de ir para escola. Foram 3 semanas caóticas!
A escola sempre se mostrou disposta a ajudar o Ângelo em seu desenvolvimento! Por dois anos tivemos a sorte de encontrar professoras bastante comprometidas com seu trabalho.
Nunca percebi preconceito por parte dos pais dos coleguinhas que conversei, pelo contrário, sempre muito carinhosos e dispostos a ajudar. Não tive a oportunidade de conversar com todos, mas havendo qualquer um contrariado, com certeza a escola me poupou.
Já por parte dos coleguinhas, é total apoio! As crianças o protegem, apoiam e ajudam! Convivendo com eles, Ângelo despertou o interesse em falar, embora ainda não consiga articular as palavras, tem se esforçado para isso. Interessa-se a aprender coisas novas, ter mais autonomia e brincar (boneco, carrinhos, joguinhos). Brincar passou a ter sentido e os brinquedos que eram deixados de lado, passaram a ter utilidade. É perceptível seu esforço em suportar ambientes cheios e barulhentos apenas para estar junto destas pessoas que ele demonstra grande amor, refletindo em outros ambientes da sociedade que exigem dele este mesmo esforço.
Quem conhece a nossa caminhada sabe o quanto a escola valeu a pena! O que essas pessoas significam e o quanto acrescentaram!

ASSISTA OS VÍDEOS DA ESCOLA: VÍDEO 1  E  VÍDEO 2

Obs.: Sei que muitos me ouviram  falar que o Ângelo não frequentou escolinha. A permanência dele foi curta e levou-se tempo para conseguir falar sobre isso. 






2 comentários:

  1. Vida, história, perseverança...! Mas, sobretudo,
    Muita vida incansável
    Com muito amor imensurável!

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